Yane, do sertão para o alto do pódio

Pernambucana ganha o inédito ouro para o País no pentatlo moderno

PUBLICIDADE

Por Valeria Zukeran
Atualização:

A pernambucana Yane Marques colocou no mapa a pequena Afogados da Ingazeira, cidade de 36 mil habitantes encravada no Sertão de Pajeú (a 380 km do Recife), ao tornar-se a primeira brasileira a conquistar uma medalha de ouro para o Brasil no pentatlo moderno. Com o resultado, a pentatleta também conquistou vaga para a Olimpíada de Pequim, em 2008. Foi orgulho demais para a mãe, Maria Gorete Marques, que teve de encarar seis meses de horas extras no trabalho de fazer doces e salgados para assistir ao feito da filha ao vivo e chorar por vê-la vitoriosa. A canadense Monica Pinette ficou com a prata e a norte-americana Mickelle Kelly com o bronze. ''''Valeu a pena todo o esforço que fiz para chegar até aqui. Todo o sacrifício de ficar longe da família'''', disse Yane, logo após a conquista. E a jornada não foi pequena para a menina que morou no sertão até os 12 anos, quando foi para o Recife atrás do sonho de ser nadadora. Até há pouco menos de quatro anos, era difícil viver do esporte em uma família sustentada pela mãe, que ganha R$ 800 por mês fazendo quitutes, e da pensão dos avós aposentados. O pentatlo moderno só apareceu na vida de Yane há cerca de quatro anos, por incentivo dos técnicos do Caxangá Golf Country Club, do Recife, onde nadava. ''''Achava que o esporte fosse corrida, natação, bicicleta e mais alguma coisa. Depois, descobri que não tinha nada a ver.'''' Com exceção da natação, Yane teve de aprender os outros quatro esportes do pentatlo: tiro, esgrima, hipismo e corrida, seu ponto fraco. Progrediu rápido e chegou a ficar em 19º lugar na última Copa do Mundo antes de disputar seu primeiro Pan. Vive com ajuda de custo de R$ 500. ''''Espero conseguir patrocínio com a medalha'''', sonha. SACRIFÍCIO Também não faltou esforço a Maria Gorete para vir ao Rio. ''''Foram seis meses economizando para poder pagar a passagem e vir até aqui'''', conta a mãe de Yane. E a saudade durante o tempo de preparação para o Pan não foi pequena. ''''Nos últimos três meses ela só passou nove dias em casa.'''' Nos outros, Yane treinou na Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende (RJ). Mas tudo valeu a pena e Maria Gorete não conteve o choro ao ver a filha subir ao lugar mais alto do pódio e ouvir, na seqüência, o Hino Nacional. Agora, a quituteira espera ter mais algum tempo para ficar perto da nova supermulher do esporte brasileiro que ajudou a criar. Os habitantes de Afogados da Ingazeira também não pouparam esforços para dar apoio à filha ilustre da cidade. Uma delegação de aproximadamente dez pessoas viajou cinco horas de carro e mais duas de avião para chegar ao Rio. E capricharam no visual e nas faixas para incentivar Yane com a ajuda de outros conterrâneos que moram na sede do Pan. A pentatleta diz que o apoio que recebeu enquanto competia foi fundamental. ''''A prova de tiro foi a mais difícil porque é a primeira e mexe muito com o meu psicológico. Mas acho que consegui ir bem'''', comentou. ''''Depois, fiz uma esgrima atípica e consegui o meu melhor tempo na natação como pentatleta, 2min12.'''' No hipismo, em que os cavalos são sorteados, Yane teve a felicidade de montar um animal que lhe deu a vantagem de sair na prova dos 3 mil metros de corrida 1min24 à frente de Pinette. Na chegada, a brasileira somou 5.484 pontos. ''''Foi muito bom ter todo aquele pessoal me apoiando'''', disse Yane, que foi elogiada pelas adversárias. ''''Tenho orgulho de dizer que fui uma das duas únicas atletas (a outra foi a brasileira Larissa Lellis, que terminou em oitavo) a tocá-la na prova de esgrima'''', afirmou Mickelle. Com a vaga garantida em Pequim, o técnico da brasileira, Alexandre França, não quer perder tempo: os treinos recomeçam na sexta-feira. E Maria Gorete começa as contas de quantos docinhos e salgadinhos terá de fazer para ver a filha competir de novo, representando o Brasil na China.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.