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(Viramundo) Esportes daqui e dali

A solidão de Prass

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Por Antero Greco
Atualização:

Milhares de atletas estão a dar os últimos retoques na preparação e a controlar a adrenalina, pela aproximação dos Jogos. À medida que os dias correm, aumenta a expectativa pelos desafios, que começam com o futebol – na quarta o feminino, na quinta o masculino – e se estendem até o dia 21. Mas, meu amigo, a vida é de lascar; a festa não será para todos aqueles que sonharam com o evento.

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Calma, pois aqui não vai outra crônica a respeito do afastamento de mais de uma centena de russos por causa do doping e etc. e tal. Fato consumado e insuperável, estes terão de ver as provas pela televisão. O tema central volta-se para um drama pessoal, solitário, amargo.

O de Fernando Prass.

O goleiro do Palmeiras festejou, recentemente, 38 anos, e ganhou como presente a convocação para a seleção brasileira. No melhor momento da carreira, que embica para a parte derradeira, surgiu-lhe a chance de liderar uma garotada na disputa por medalha olímpica. Ou, na hipótese menos brilhante, participar da maior competição esportiva do planeta. Oportunidade única e já suficiente para guardar como de lembrança.

Daí aparece o destino a aprontar uma falseta e tanto. Um movimento fora do normal nos treinamentos, a dor no cotovelo, a suspeita de contusão. Os exames médicos, o repouso, o descanso no amistoso com o Japão. Até que, em simples exercício de rotina, o mal se acentua, a constatação de fratura, o corte do grupo, a tristeza.

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Pronto, de uma hora para outra, o sonho da Olimpíada desaparece. E, como desgraça pouca é bobagem, termina também o ano no Palmeiras. Não deve recuperar-se em tempo de ajudar o time na corrida pelo título nacional, jejum que vem desde 1994.

Riscos são inerentes à profissão de Prass, sobretudo pela posição em que atua, muita exposta a um chute mais forte, a uma dividida com atacante, a choque com as traves, a uma torção, luxação no ombro. Ou a uma fratura na mão, o grande medo de quem tem como tarefa evitar gols. Pois foi justamente essa maldição que o atingiu.

Azar demais, difícil até escrever algo que pudesse consolá-lo. Não dá nem para dizer que a vida é assim, que são ossos (rompidos) do ofício, que talvez algo mais bacana lhe esteja reservado adiante, que são desígnios insondáveis da Providência, que o importante é o apoio da família, dos amigos e dos colegas. São palavras de senso comum e simpatia, que, no entanto, não resolvem nada. O desejo de Prass era disputar os Jogos do Rio. E que não venham, para piorar, com o lugar-comum de que foi a vontade dos “deuses do futebol”. Uma pinoia!

Baixas como a de Prass, às vésperas de um campeonato, não são inéditas. Não foi ele o primeiro a ver-se obrigado a abandonar um grupo em cima da hora. Em épocas de Copa do Mundo são frequentes notícias do gênero. Só para ficar em história da seleção há diversos casos: Clodoaldo em 1974, Careca em 1982, Cerezo em 1986, Ricardo Gomes em 1994, Romário em 1998, Emerson em 2002.

Exemplos só ilustrativos, que não diminuem a dor de Prass. Não há atleta que queira entrar para semelhante tipo de estatística. Não é esse o conceito de “fazer história”.

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No quesito técnico, a seleção não deve perder demais. Uilson, titular no sábado, e agora o experiente Weverton, estão em condições de suportar o fardo; são bons de bola. Não é essa a questão. Prass fará falta pela liderança, pela experiência, pelo caráter. O jeito de tiozão, já com uns grisalhos a despontarem na cabeleira não tão vasta, o faz respeitado pelos jovens. Não ostentaria a faixa de capitão – havia ficado para Neymar, o astro da companhia –, mas funcionaria como a referência dentro de campo, a voz do treinador, o orientador.

Bom, também isso não serve mais de consolo. Prass voltou ontem para casa, no aeroporto foi recebido pela mulher e filhos. Verá os Jogos pela tevê. Eu não teria ânimo.

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