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História, política e cultura do esporte.

De Formigas a Rayssas: mulheres são 49% dos atletas nos Jogos de Tóquio

Equidade de gênero é uma das principais bandeiras da Olimpíada japonesa; delegação feminina do Brasil pode pela 1ª vez trazer mais medalhas que a masculina

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Por João Abel
Atualização:

Miraildes nasceu em 1978. Baiana de Salvador. Ela não sabia, mas faria história praticando um esporte que, no momento de sua chegada ao mundo, era proibido por lei para as mulheres no Brasil. Foi justamente no ano seguinte, 1979, que caiu o absurdo veto ao futebol feminino, criado no Estado Novo de Getúlio Vargas. Que sorte a de Miraildes. E que sorte a nossa.

Dentro de campo, ela se tornou Formiga. Uma lenda da seleção brasileira, que vai atingir, em Tóquio, a assombrosa marca de sete Jogos Olímpicos disputados, com duas pratas conquistadas, em Atenas-2004 e Pequim-2008.

Formiga estreou em Olimpíadas em Atlanta-1996. Rayssa Leal e sua modalidade, o skate, debutam em Tóquio-2020 Foto: CBF e Instagram/Rayssa Leal

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Quando Formiga subiu ao seu segundo pódio, Rayssa ainda nem sabia andar. A menina maranhense, da cidade de Imperatriz, tinha menos de um ano de vida. Mas depois que aprendeu a dar os primeiros passos, não demorou para descobrir que a junção de seus pés e a prancha de skate faria o mundo inteiro aplaudir. No Japão, agora com 13 anos de idade, a ‘fadinha’ Rayssa Leal entra para a história como a mais jovem atleta brasileira em uma Olimpíada.

Formiga e Rayssa, separadas por 30 anos de diferença, representam uma das bandeiras mais importantes dos Jogos de Tóquio: a da equidade de gênero. Quando for aberta oficialmente na sexta, 23, esta edição começa a cravar seu nome na história como a mais igualitária de todos os tempos. De cada 100 atletas, 49 são mulheres.

Quando a primeira Olimpíada da era moderna ocorreu, há 125 anos, em Atenas, as mulheres não puderam competir. Eram 241 atletas em 9 modalidades, todos homens. Um dia após o fim do evento, a grega Stamati Revithi fez o percurso completo da maratona, como uma forma de protesto. Foi apenas na segunda edição, os Jogos de Paris-1900, que elas passaram a ter uma pequena participação: eram 2% dos atletas.

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Ao longo do tempo, a proporção feminina cresceu a passos lentos. Foram 9,6% em Amsterdã-1928, 13,3% em Melbourne-1952 e 20,7% em Montreal-1976. É só a partir dos anos 1980 em que a curva realmente ascende, até passar os 30% em Atlanta-1996, os 40% em Atenas-2004 e chegar a 45% no Rio, em 2016.


E se o Brasil pretende atingir o recorde de 20 pódios em Tóquio, agradeça a elas. Muitas representantes femininas da delegação são esperança de medalhas e elas podem, pela 1ª vez na história, trazer mais pódios ao País do que os homens.

Olho em Bia Ferreira, campeã mundial da categoria peso leve no boxe, em Ana Marcela Cunha, lenda da maratona aquática, e na dupla Kahena Kunze e Martine Grael, campeãs olímpicas na vela há cinco anos.

No vôlei de praia feminino, duas duplas brasileiras fizeram a final da última etapa do circuito mundial de vôlei de praia: Ágatha/Duda venceram Ana Patrícia/Rebecca, em Gstaad, na Suíça, na semana passada. Um ótimo presságio, quem sabe, de um pódio em dose dupla. Melhor que isso, só a possibilidade (um tanto factível) de ouro, prata e bronze para o Brasil no skate street, com Leticia Bufoni, Pâmela Rosa e ela, Rayssa Leal.

Na cerimônia de abertura, pela 1ª vez uma mulher negra vai carregar nossa bandeira: a judoca Ketleyn Quadros, medalhista de bronze em Pequim, ao lado de Bruno, do vôlei de quadra.

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Ketleyn Quadros foi a primeira mulher a conquistar uma medalha olímpica em esportes individuais Foto: COB

A presidente do comitê organizador dos Jogos de Tóquio, Seiko Hashimoto, já afirmou que quer fazer da edição japonesa “um ponto de virada na história”. Não só para mulheres, mas para outros grupos sub-representados. Veremos, por exemplo, a estreia de uma uma atleta transgênero em Olimpíadas. É a neozelandesa Laurel Hubbard, do levantamento de peso.

Que no futuro, quando olharmos em retrospectiva para os Jogos de 2021, a lembrança seja a da igualdade e inclusão.

Formigas. Rayssas. Beatrizes. Ketleyns. Que elas existam cada vez mais.

*João Abel é editor do Drops, no Instagram do Estadão, autor de ‘Bicha’ e coautor de ‘O Contra-Ataque’. Escreve às quartas-feiras.

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