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Nobres de várias partes do mundo mantêm o espírito aristocrático do COI

Espírito de família de Comitê começou com o barão fundador da entidade

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Por Redação
Atualização:

Sete horas da manhã no Rio de Janeiro. Na avenida Lúcio Costa, o engenheiro industrial espanhol Juan Antonio Samaranch Junior, de 56 anos, se prepara ao lado de um poste para sua corrida matinal. Desconhecido do grande público brasileiro, ele é o herdeiro de um dos dirigentes mais influentes do esporte no século 20 – seu pai, Juan Antonio Samaranch, que morreu aos 89 anos em 2010, foi presidente do Comitê Olímpico Internacional (COI) entre 1980 e 2001. Hoje, ele é o dirigente que assume parte das principais funções do COI, num verdadeiro espírito de “família” e numa tradição de “clã” que vem desde o fundador da entidade, o Barão francês Pierre de Coubertin.

Hospedados em um luxuoso hotel na Barra da Tijuca, a tradicional “família olímpica” traz com seus integrantes literalmente um novo estilo e uma nova roupa, que precisou ser adaptada ao quente inverno carioca – dirigentes circulam com agasalhos esportivos, tênis e roupa de ginástica. Mas, repleto de aristocratas, milionários e verdadeiros coronéis em seus países, o COI também perpetua o clima de nobreza entre seus integrantes.

Carlos Arthur Nuzman (esquerda) conversa com Albert, príncipe de Mônaco Foto: Jamil Chade/ Estadão

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A reportagem do Estado foi uma das poucas a obter autorização para entrar no “bunker” criado pela entidade para manter a “família” protegida, inclusive da imprensa. Dentro, um clima amistoso entre os membros da entidade se mistura ao dos técnicos que, freneticamente, tentam encontrar soluções para os desejos das personalidades e os contratempos dos Jogos.

TAREFASMas poucos são os dirigentes que terminam o café da manhã antes das 10h30, num salão onde se esbarram o príncipe da Dinamarca, o grão-duque de Luxemburgo, condes e parte da nobreza mundial. O filho do rei Hussein, da Jordânia, o príncipe Faisal bin Hussein, admitia que as funções políticas e esportivas que precisa assumir chegam a criar problemas em sua agenda. “Não vou poder assistir a toda a Olimpíada. A guerra na Síria é muito grave”, apontou.

Integrante do Comitê Executivo do COI, o príncipe jordaniano trata das questões do movimento olímpico com a mesma seriedade no tom de voz com que aborda a crise de refugiados no Oriente Médio. De cabeça, ele lista todos os atletas que seu país traz para a disputa dos Jogos no Rio.

O príncipe Albert, de Mônaco, também faz questão de mostrar como é um profundo conhecedor de diversas modalidades. Ele ainda afirmou que nos próximos dias, pretende percorrer diversas instalações esportivas espalhadas pela cidade.

O príncipe comentou que, de fato, sua maior preocupação é com terrorismo nos Jogos Olímpicos. “Vamos torcer para que nada ocorra. O mundo está louco”, disse. Nice, local onde o Estado Islâmico realizou atentado, no dia 14 de julho, fica poucos quilômetros de Mônaco e a questão ainda o tormenta.

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Mas sua volta para o principado – famoso pelo circuito de rua de F-1 – antes do final da Olimpíada tem outro motivo: os seus filhos gêmeos. Os bebês Gabriella e Jacques, de 19 meses, estão sob os cuidados da mãe, a princesa Charlene de Mônaco. “Ainda é um pouco difícil essa fase”, disse.

'ATLETAS'Salvo nas reuniões formais, a ordem é de que cada um dos dirigentes se comporte como um atleta ou pelo menos próximo ao movimento esportivo. Camisas polo, calças de ginástica, abrigos e, principalmente, o abandono das formalidades reais são requisitos. “Afinal, nós já estamos no século 21”, comentou deles.

Albert, de Mônaco, é um dos que mais insistem em abraçar seus colegas africanos no COI, romper qualquer formalidade e distribuir elogios a todos.

Mas a aparência de normalidade rapidamente termina quando eles precisam sair desse mundo paralelo e cruzar a porta do local onde estão. O príncipe Faisal, para deixar o hotel, foi acompanhado por cinco agentes da Polícia Federal, mais seus seguranças particulares e um grande grupo de diplomatas de diverso países.

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Nesse meio, poucos são atletas de fato. O ucraniano Serguei Bubka, considerado por muitos o maior saltador com vara de todos os tempos e medalha de ouro na Olimpíada de Seul-1988, e o russo Alexander Popov, bicampeão olímpico das provas dos 50 metros e 100 metros nos Jogos de Barcelona-1992 e Atlanta-1996, são alguns deles. Também não faltam os dirigentes polêmicos e com os quais poucos querem ter contato, como o ex-presidente da Fifa Issa Hayatou e que chegou a ser repreendido pelo COI por corrupção.

Quem também tem evitado a convivência em família são os membros russos. Os dirigentes do Kremlin, acusados de promover doping de Estado, têm optado por tomar café da manhã cedo, evitando os demais.

Enquanto a maioria dos dirigentes brincam uns com os outros, falam de suas famílias e combinam viagens a locais exóticos do mundo, o presidente do Comitê Olímpico Russo, Alexander Zhukov, preferia os cantos do saguão. Não longe dali, Richard Pound, o homem que investigou a crise do doping na Rússia, ainda não superava sua frustração diante da presença de Moscou nos Jogos.

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“Isso é uma ofensa”, disse à reportagem o canadense, enquanto ajustava sua bermuda para correr pela praia.

RENDACom ou sem briga de família, a realidade é que todos estão muito bem financeiramente e hoje, no Rio, vão escutar da direção do COI que as contas jamais estiveram tão sólidas.

Nos últimos anos, além de nobres e representantes esportivos, a família também ganhou megaempresários, como dirigentes da rede NBC. Richard Carrion, um dos homens que por anos se ocuparam do cofre do COI, é um dos principais banqueiros da América Latina e chegou a ocupar um cargo do Federal Reserve Bank, em Nova York. O próprio Samaranch Junior também ganha a vida na área de finanças, assim como vários de outros membros.

Com a transformação do COI de clube de pessoas ligadas ao esporte em entidade repleta de membros milionários, as exigências também aumentaram. Por membro, o custo de hospedagem deve superar a marca de R$ 50 mil em diárias no Rio. Em eventos nos últimos anos, manter a família olímpica saiu caro. Em Salt Lake City, por exemplo, os barões gastaram US$ 750 mil (R$ 2,447 milhões) apenas em café da manhã, segundo os documentos oficiais.

Mas as contas mostram que o Comitê Olímpico Internacional tem como arcar com tudo isso. Nunca, em mais de cem anos, os senhores dos anéis estiveram tão bilionários como agora, num forte contraste com a situação em que se encontravam nos anos 70, quando estavam praticamente falidos.

Ignorando a crise no Brasil e o déficit nos Jogos para o comitê brasileiro, a entidade com sede na Suíça vai terminar os Jogos com renda recorde de US$ 5,5 bilhões (R$ 17,9 bilhões). O valor é quase o dobro do que foi registrado em 2004, em Atenas, e tudo indica que a fortuna olímpica continuará.

Nas salas de reunião do COI e no saguão do bunker instalados no Rio, não faltam lobistas de empresas multinacionais em busca de contratos para os Jogos de 2020 e 2024.

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Seja qual for o destino das contas do evento brasileiro, o COI sabe que deixa o País com uma condição financeira única e que seus dirigentes estão muito bem amparados. “A família olímpica está muito feliz”, afirmou o presidente de honra do COI, Jacques Rogge. Foi ele que, em 2009, abriu o envelope com o nome “Rio de Janeiro”.