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Mistério domina ?circo? da F-1

Por Agencia Estado
Atualização:

A cena dos mecânicos da Williams testando a suspensão eletrônica de um de seus carros - imagem registrada pela TV Globo no início dos anos 90 - é algo inimaginável na Fórmula 1 de hoje. Quem for ao autódromo de Interlagos disposto a observar a montagem dos bólidos das principais equipes e o trabalho dos mecânicos certamente sairá decepcionado. As escuderias montam boxes com decoração sofisticada, mas não querem mais aparecer. Ferrari, McLaren, Williams, Benetton e Jordan isolaram os boxes com divisórias plásticas. Elas escondem os segredos de seus carros e, cada vez mais, controlam o que dizem seus pilotos. Até câmeras anti-espionagem foram instaladas. É difícil furar o bloqueio sem ser convidado. "Ninguém quer mostrar seus segredos de suspensões, amortecedores, molas e acertos aerodinâmicos", afirma o piloto Tarso Marques, da Minardi. A vigilância, no entanto, chega a pontos extremos. Nesta quarta-feira, um cinegrafista foi expulso pela assessora de imprensa Stefania Bocchi da frente do box da Ferrari porque registrou o momento em que o motor do carro de Michael Schumacher foi ligado para teste. Toda a parte dianteira do carro estava coberta, incluindo os sistema de freios. Na McLaren, uma cortina preta foi colocada à frente dos carros de Mika Hakkinen e David Coulthard. Chefes de equipe, projetistas, pilotos, enfim, quem é notícia na Fórmula 1, só pode falar com o assessor de imprensa do lado. E, obviamente, o que foi instruído a dizer. A espontaneidade é absolutamente proibida, ou melhor, tudo é proibido na Fórmula 1. Pilotos que ignoram a imprensa, fãs que fazem questão de deixar claro que não necessitam desse tipo de divulgação ou apoio são comuns na Fórmula 1. Faz parte do marketing do evento ser indiferente, por vezes indelicado e até agressivo. Alguém que entre com propósitos distintos logo é lembrado que essas são as regras da Fórmula 1. Se não quer ser indiferente que ao menos mantenha a boca fechada. Alguém que não conheça esse universo com valores muito próprios choca-se com a distância existente entre os que trabalham na Fórmula 1 e os que trabalham para a Fórmula 1. Parece não existir uma relação íntima e essencial entre a Fórmula 1 e a imprensa. É como se a Fórmula 1 não dependesse da mídia para sobreviver. Nesse sentido, os próprios veículos de comunicação demonstram não ter consciência da sua importância no processo, ao aceitar quase sem resistência as milhares de imposições, restrições e mesmo agressões de alguns dirigentes, donos de equipe e pilotos. Praticamente não há mais chance de um profissional de comunicação aproximar-se, por exemplo, de Michael Schumacher, e fazer-lhe uma pergunta. O piloto é orientado a não responder. Quem desejar saber algo que o faça nas entrevistas coletivas. Antes desses encontros com a imprensa, contudo, os assessores simulam as perguntas mais prováveis e elaboram o que deve ser respondido, nem que isso seja exatamente oposto ao que pensa o piloto. O que interessa é a imagem que ele irá passar dele próprio, da equipe e, claro, dos patrocinadores que investem milhões de dólares no negócio. A figura do assessor de imprensa hoje na Fórmula 1 lembra a do censor na época das ditaduras. A informação vem sob a forma de kit e, evidentemente, igual para todos. Quase não há mais formas de se produzir uma reportagem exclusiva, densa, diferenciada, curiosa, oportuna. Qualquer necessidade de se ouvir alguém das equipes deve ser antecedida de um pedido formal, por escrito, onde o solicitante deve explicitar o que será abordado na conversa. Nessa hora entra em jogo também uma espécie de check list. Os responsáveis pela comunicação na Fórmula 1 observam primeiro qual é a mídia. Se for televisão, em que as marcas que seus times divulgam irão aparecer, as chances são maiores do pedido ser atendido. Mesmo assim depende do país a quem a TV está ligada. Os da Europa, claro, têm preferência. Imprensa escrita e da América do Sul é a última a ser atendida nessa escala. Invariavelmente os assessores de imprensa respodem não ser possível em razão "da agenda lotada do entrevistado."

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