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Não é de hoje que a Confederação Brasileira de Vôlei sofre acusações de irregularidades. Entenda

Entidade encara denúncias de lavagem de dinheiro, furto qualificado, falsidade ideológica e organização criminosa desde 2014; principal alvo é seu ex-presidente Ary Graça

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Foto do author Robson Morelli
Por Robson Morelli e Marcio Dolzan/RIO
Atualização:

A Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) é acusada de lavagem de dinheiro, furto qualificado, falsidade ideológica e organização criminosa ao desviar R$ 52 milhões nos anos em que Ary Graça era presidente da entidade. Ele ficou no cargo até 2012, quando assumiu a federação internacional da modalidade, uma das mais importantes do Brasil. Duas horas depois que a polícia saiu da sede da entidade no Rio, seu ex-presidente se manifestou em nota pelos seus advogados.

"O Dr. Ary Graça recebeu com surpresa a busca em seu apartamento e a notícia veiculada hoje cedo pela mídia. Ele está em Lausanne, seu local de residência por motivo de trabalho, e acionou seu advogado para tomar ações imediatas no sentido de contestar as alegações, as mesmas feitas no passado e que agora voltam à tona. Ary Graça prestou todos os esclarecimentos à época em que as alegações foram levantadas e, após seu pronunciamento, não houve qualquer ação resultante por parte da justiça brasileira. Como anteriormente, ele se coloca à disposição das autoridades para quaisquer esclarecimentos." 

Operação mira endereços ligados ao ex-presidente da entidade Ary Graça, que atualmente comanda a Federação Internacional de Vôlei (FIVB). Foto: Divulgação /FIVB

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Desde 2013, a polícia civil e o Ministério Público investigam o caso nas duas sedes da entidade, na Barra da Tijuca e em Saquarema. A Justiça do Rio bloqueou bens dos acusados no suposto esquema no valor de R$ 52 milhões, como uma lancha esportiva. A polícia encontrou na casa do ex-presidente da CBV, no Rio, US$ 20 mil em espécie. Não havia mandado de prisão na investida ocorrida na manhã desta quinta-feira.

Além de Ary Graça, mais nove pessoas ligadas ao vôlei são investigadas, além do ex-prefeito de Saquarema Antonio Peres Alves. A operação foi chamada de "Desmico", uma jogada de rede do vôlei quando um atleta faz o cortaluz para outro detrás cortar. Foram 20 mandados de busca e apreensão nos bairros do Leblon, Barra, Copacabana, Ilha do Governador e Vargem Grande, na capital fluminense, além do município de Saquarema. Segundo denúncia do MPRJ, durante o mandato do prefeito (2000-2008) foram editadas três leis complementares que concediam benefícios fiscais abaixo do piso constitucional, o que fez com que várias empresas fantasmas fossem criadas na cidade. Algumas dessas empresas negociavam com a CBV.

A manobra promoveu um aumento exponencial e irregular da arrecadação em Saquarema, ao mesmo tempo em que provocou evasão fiscal em outras cidades, já que empresas de outros municípios passaram a declarar - falsamente - sede em Saquarema.

De acordo com o delegado Thales Nogueira, titular da Delegacia de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (DCC-LD), descobriu-se que em dois pequenos escritórios em Saquarema funcionavam de forma fictícia mais de 1.000 empresas que recebiam benefícios fiscais concedidos pelo então prefeito. Os valores obtidos com as centenas de contratos de sublocação eram repartidos entre os integrantes da organização criminosa.

Contra Ary Graça, a denúncia afirma que o ex-presidente da CBV manejava recursos de patrocínio do Banco do Brasil à entidade em favor de si próprio e do grupo criminoso, celebrando contratos com empresas recém-criadas (e fantasmas). Desta forma, apesar de possuir sede na capital, a CBV celebrou contratos que não foram devidamente executados com empresas estabelecidas em Saquarema.

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OUTRO LADO

A Confederação Brasileira de Voleibol (CBV) confirma que recebeu a Polícia Civil em suas sedes por conta da investigação. Funcionários da confederação prestaram auxílio às autoridades que buscavam documentos relativos a um suposto esquema de fraude tributária que teria contado com o auxílio do ex-presidente da CBV, Ary Graça Filho. De acordo com as investigações, a CBV teria sido vítima dos seus então dirigentes, que teriam criado contratos fictícios para desviar dinheiro da instituição. Um clássico processo de lavagem de dinheiro. Esse dinheiro teria vindo dos patrocinadores da entidade, como o Banco do Brasil, por exemplo, e deveria ser repassado à organização ao longo das temporadas.

"A atual gestão da confederação cooperará integralmente com a investigação e, se forem comprovados prejuízos financeiros à CBV, tomará todas as medidas necessárias para que estes valores sejam integralmente ressarcidos à comunidade do voleibol", informou o atual comando da CBV. Um cofre foi levado pelos policiais durante as 3 horas da batida em sua sede. Todos os envolvidos não fazem mais parte da atual administração da CBV. Ary Graças levou o caso para seus advogados. Ele está na Suíça, sede da FIVB.

Nesta sexta-feira, a entidade emitiu a seguinte nota: "A CBV esclarece que a operação Desmico, deflagrada pelo Ministério Público do Rio e pela Polícia Civil, tem como alvo o ex-presidente da entidade Ary Graça Filho, e não a Confederação. A entidade não apenas colaborará com as investigações como se habilitará para ser assistente de acusação do MP. A instituição fará tudo o que estiver ao alcance para que os responsáveis pelos malfeitos sejam punidos e para que os valores desviados sejam integralmente ressarcidos aos cofres da CBV."

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HISTÓRICO

Em 2014, irregularidades apresentadas pela Controladoria Geral da União (CGU) identificaram desvio de R$ 30 milhões em contratos da CBV. Na época, o jogador Murilo admitiu ao Estadão que o escândalo foi uma surpresa para a maioria dos atletas. "Para nós, era sempre muito difícil (saber dessas coisas). Tínhamos pouco contato com os diretores. Não dava para desconfiar de nada", disse.

Quando deixou a presidência, Ary Graça passou o bastão para seu vice Walter Potombo Larangeiras, que estava na entidade fazia 30 anos. Na época, pensou-se em paralisar os campeonatos nacionais, mas Murilo disse que "isso seria uma punição aos clubes". Meses depois da denúncia feita em 2014, a CBV demitiu seu CEO, o dirigente Marcos Pina. Ele foi acusado de fazer negócios ilícitos com a entidade por meio de uma empresa sua chamada SMP Consultoria Esportiva.

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Em nota oficial da CBV na época, a entidade se propôs a passar o caso a limpo. Reafirmou que estava tomando todas as providências cabíveis para apurar fatos e responsabilidades em relação a denúncias publicadas pela imprensa. Assumiu ainda o compromisso de manter total transparência em relação ao processo de investigação, informando parceiros, patrocinadores e a sociedade brasileira sobre seus resultados. Atletas como Bruninho, filho de Bernardinho, usaram as redes sociais para se manifestar. "Nós não vamos nos calar", postou em seu Twitter o levantador da seleção brasileira Bruninho, não escondendo toda a sua tristeza com o cenário do vôlei no Brasil, divulgado através de uma série de denúncias feitas pela ESPN Brasil, que culminou com o encerramento da parceria do esporte com o Banco do Brasil, apoio que durava 23 anos.

RELEMBRE O CASO DE 2014

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Reportagem da ESPN cita que o relatório da CGU aponta "contratação de empresas de consultoria sem que se consiga verificar a efetiva contraprestação do serviço; contratação de empresas sem estrutura física e de pessoal; contratação de empresas cujos proprietários são ou foram ligados à CBV; contratação de empresas do mesmo proprietário que executa e audita a prestação de serviço; pagamento de notas fiscais sequenciais que demonstram que a empresa comandada prestava serviço somente para a CBV; pagamento de notas fiscais com descrição genérica do objeto contratado, como "comissionamento" ou "assessoramento".

O relatório também tratava do caso da SMP, empresa de Marcos Pina, ex-dirigente da CBV ligado ao ex-presidente Ary Graça, que a CBV pagou, por "prospecção de cotas de patrocínio, propriedades e títulos" aproximadamente R$ 3 milhões entre 2012 e 2013. Ainda de acordo com a reportagem, a CGU concluiu que "não há provas da prestação do serviço contratado pela CBV" e que "a empresa não possui infraestrutura física nem pessoal".

Os pagamentos feitos à SMP continuaram também na nova gestão da CBV, comandada por Walter Pitombo Laranjeiras. Ainda de acordo com o relatório citado pela ESPN, a empresa recebeu R$ 188 mil em 2014, a título de "assessoria de gestão administrativa esportiva".

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